Juiz julga improcedente processo eleitoral contra Matias e Fábio
O juiz IOLMAR ALVES BALTAZAR, julgou improcedente o processo eleitoral movido pela coligação TODOS POR BARRA VELHA (PMDB, PSD, PTB, PR, PSC, PPS, PDT e PRB) contra a dupla eleita com 66,49% dos votos dos eleitores de Barra Velha.
SENTENÇA
Vistos etc.
Trata-se de representação eleitoral sob a alegação da prática de condutas vedadas a agentes públicos em campanha e não desincompatibilização dos representados de forma válida ou em tempo oportuno.
Citados, os representados apresentaram resposta.
Houve réplica.
O feito foi instruído com a oitiva de algumas testemunhas arroladas pelos representados, não havendo comparecido à audiência de instrução nenhuma das testemunhas arroladas pelo representante.
Não havendo requerimento de diligências, as partes fizeram alegações finais remissivas à petição inicial e à resposta, respectivamente.
O Ministério Público Eleitoral exarou o seu parecer pela improcedência da demanda.
É o relatório. Decido.
DESINCOMPATIBILIZAÇÃO
As questões aventadas pelo representante à guisa de inelegibilidade por ausência de desincompatibilização válida dos representados estão rigorosamente preclusas, nos termos do artigo 259 do Código Eleitoral, não se mostrando, ademais, adequada a via eleita.
A razão está em que a desincompatibilização, por se tratar de inelegibilidade infraconstitucional e preexistente, é de ser arguida na fase da impugnação do registro, sob pena de preclusão (Tribunal Superior Eleitoral, Ac. 6856, de 3.10.2006, Relator Ministro Carlos Ayres Britto).
A prova da desincompatibilização deve ser juntada ao Pedido de Registro de Candidatura (Resolução TSE 23.373/2011). Em sendo matéria preexistente, tenho que ao término do prazo para os registros das candidaturas, portanto, tinha o representante perfeitas condições para aferir a desincompatibilização ou não dos representados e manejar, a tempo e modo, em sendo o caso, Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, com fundamento no artigo 3º da Lei Complementar 64/90, na Resolução TSE 23.373/2011, nos artigos 10 a 16 da Lei 9.504/97 e nos artigos 82 a 102 do Código Eleitoral.
Ora, é a Lei Complementar 64/90 (Lei das Inelegibilidades) que exige a desincompatibilização, ato pelo qual o candidato que incida em alguma incompatibilidade relativa (por razões funcionais) deva se afastar a tempo para concorrer às eleições, sob pena de ser considerado inelegível e ter o registro de candidatura indeferido. Além de preexistente, então, a desincompatibilização também ver a ser matéria infraconstitucional.
Assim, a partir da publicação dos requerimentos de registro, tem início o prazo de 5 (cinco) dias para as partes legitimadas (Candidatos, Partidos, Coligações e Ministério Público) apresentem impugnação aos registros de candidaturas. Este é o momento adequado para se arguir violação à regra da desincompatibilização. Somente em casos excepcionais (de fato superveniente ou de violação à norma constitucional) é que se admite que a ausência de condição de elegibilidade (desincompatibilização) seja arguida depois daquele prazo, em sede de Recurso contra a Diplomação, o que não é o caso dos autos.
Nos termos da doutrina, o prazo para impugnar o registro de candidatura é peremptório e decadencial, assim, não se admite elastério e o não exercício dessa faculdade acarreta a perda do direito de impugnar ((Elmana Viana Lucena Esmeraldo, Processo Eleitoral, sistematização das ações, Mizuno, 2 edição, 2012, p. 272).
Destaco da jurisprudência, quanto à preclusão:
As causas de inelegibilidade do candidato que sejam de ordem infraconstitucional e preexistente à formalização da candidatura perante a Justiça Eleitoral devem ser arguidas, sob pena de preclusão, no prazo de impugnação ao pedido de registro de candidato (Lei Complementar 64/90, art. 3º, caput).
(Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, Acórdão 24.581, Relator Juiz Sérgio Torres Paladino)
Quando a inelegibilidade for de natureza infraconstitucional e de ocorrência anterior ao registro de candidatura, deve a mesma ser arguida no prazo de 5 (cinco) dias estipulado no art. 3º da LC nº 64/90, sob pena de tornar-se matéria preclusa, por força do disposto no art. 259 do Código Eleitoral.
(Tribunal Superior Eleitoral, Agravo de Instrumento 3018, Relator Ministro Fernando Neves da Silva)
Vale a máxima, portanto, de que "o direito não socorre a quem dorme" , para a garantia do valor segurança jurídica e estabilidade do processo eleitoral.
Em acréscimo, diante das assertivas do representante, à folha 9, de que somente tomou conhecimento da ausência de desincompatibilização questionada posteriormente ao registro da candidatura, homologada pela Justiça Eleitoral em decisão transitada em julgado, é de se ver que o motivo da inelegibilidade é que deve ser superveniente ao registro, não o conhecimento dele pelos interessados (Elmana Viana Lucena Esmeraldo, Processo Eleitoral, sistematização das ações, Mizuno, 2 edição, 2012, p. 274).
Por outro lado, quanto à alegação de que o Candidato a Vice-Prefeito, Fábio Brugnago, continuou a exercer de fato as suas funções na administração municipal, mesmo após o seu pedido de afastamento, é de se ver que não existem provas bastantes e seguras a respeito, máxime porque o representante não trouxe nenhuma testemunha que pudesse confirmar tal fato em Juízo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
De qualquer sorte, ao que consta dos documentos coligidos às folhas 413 a 416, o representado Fábio Brugnago solicitou o seu desligamento da Secretaria Municipal de Administração em 5 de janeiro de 2012, havendo sido exonerado por meio da Portaria 24/2012, como bem destacado pelo Ministério Público, fato que está corroborado pela prova testemunhal. Quanto ao cargo de Pregoeiro, por sua vez, ressalto que a Portaria 28/2012, de 6 de janeiro de 2012, expressamente revogou a Portaria 328/2011, que havia nomeado o representado. Em conclusão, não há se falar em falta de desincompatibilização do representado Fábio Brugnago.
Assim, em face da preclusão, não conheço do mérito das alegações referentes à ausência válida ou oportuna de desincompatibilização.
CONDUTAS VEDADAS A AGENTES PÚBLICOS
Nos termos da doutrina de Rodrigo López Zílio:
As condutas vedadas, na esteira de entendimento sedimentado pela doutrina e jurisprudência, constituem espécie do gênero abuso de poder e surgiram como um antídoto à reeleição. Em verdade pode-se conceituar os atos de conduta vedada como espécies de abuso de poder político que se manifestam através do desvirtuamento dos recursos materiais (incisos I, II, IV e parágrafo 10 do artigo 73 da Lei 9.504/97), humanos (incisos III e V do artigo 73 da Lei 9.504/97), financeiros (incisos VI, a, VII e VIII do artigo 73 da Lei 9.504/97), e de comunicação (incisos VI, b e c, do artigo 73 da Lei 9.504/97) da Administração Pública.
(Direito Eleitoral, São Paulo, Verbo Jurídico, 2008, p. 458)
O objetivo, portanto, é apurar a prática de condutas realizadas por agentes públicos expressamente vedadas que tendem a desigualar a disputa eleitoral entre os candidatos, em atenção à igualdade e à probidade.
Revisão de remuneração em período vedado
Sustenta o representante que a Lei 1.154, de 20 de janeiro de 2012, e sua prorrogação por mais três meses, teria revisado remuneração de servidores e, em razão disso, violado o inciso VIII do artigo 73 da Lei 9.504/97, que dispõe:
Fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.
Para as Eleições 2012, a Resolução TSE 21.370/2011 estabeleceu o período para essa proibição entre 10 de abril de 2012 até a posse dos eleitos.
Nos termos da doutrina:
Inicialmente, cabe esclarecer que a enumeração das condutas vedadas pela Lei das Eleições é numerus clausus, porquanto não comporta acréscimos, uma vez que se trata de medidas restritivas, tampouco admite interpretação extensiva ou ampliativa.
(Elmana Viana Lucena Esmeraldo, Processo Eleitoral, sistematização das ações, Mizuno, 2 edição, 2012, p. 173).
Por ser numerus clausus, somente se subsume à norma do inciso VIII do artigo 73 da Lei 9.504/97 a revisão geral da remuneração dos servidores públicos.
O que o dispositivo proíbe, portanto, é concessão geral de aumentos gerais de remuneração dos servidores públicos (Pedro Roberto Decomain, Eleições, Comentários à Lei 9.504/97, Dialética, São Paulo, 2004, p. 358).
No caso, não houve revisão geral da remuneração dos servidores públicos municipais, mas concessão de abono pecuniário a um universo muito reduzido de servidores (menos de dez agentes) que exerciam funções de pedreiro, calceteiro e soldador.
Não bastasse isso, confiro que ditos abonos estavam amparados em Lei editada em 20 janeiro de 2012 (folha 107), dentro do período permitido, já contendo a norma originária previsão expressa de possibilidade de prorrogação por mais três meses por ato do Chefe do Executivo.
Logo, a improcedência, no ponto, é medida que se impõe.
Gastos com Publicidade
Sustenta o requerente, também, que a média dos gastos com publicidade, referente aos anos de 2009, 2010 e 2011, alcançou o montante de R$ 159.523,14, ao passo que os recursos despendidos em relação aos meses de janeiro a junho de 2012 atingiu o valor de R$ 163.505,13, havendo gastos demasiados com publicidade, numa diferença, a maior, de R$ 3.981,99.
Dispõe o inciso VII do artigo 73 da Lei 9.504/97:
Realizar, em ano de eleição, antes do prazo fixado no inciso anterior, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição.
Nos termos da lei, então, são consideradas duas médias: a dos gastos nos últimos 3 (três) meses antes do pleito e a média do último ano imediatamente anterior à eleição. A conta é feita somando-se os gastos mensais e dividindo-se o total pelo número de meses.
Contudo, no caso, a conta apresentada pelo requerente não se conforma com a lei e os documentos às folhas 115 a 121, referentes a 2012, contém alguns itens que não se referem a gastos com publicidade, conforme consta incontroverso.
Ademais, tenho que eventual diferença mínima nos gastos porventura havidos não caracteriza o indigitado ato abusivo do ponto de vista da legislação eleitoral, à míngua de gravidade suficiente para macular o equilíbrio eleitoral, à luz do vetor da proporcionalidade.
Para Thales Tácito Pontes Luz de Pádua Cerqueira:
O princípio da proporcionalidade está ligado à razoabilidade do ato ou gravidade do ato no caso concreto, também é chamado "princípio da proibição do excesso" ... Trata-se do que denomino "princípio da bagatela ou insignificância eleitoral" , ou seja, condutas ínfimas ou desproporcionais não podem se sobrepor ao princípio majoritário... A expressão "tendentes a afetar" é a primeira manifestação do princípio da proporcionalidade, ou seja, somente se aplica mencionado dispositivo se, e somente se, houver desequilíbrio eleitoral. Ora, não havendo, não se pune.
(Tratado de Direito Eleitoral, Tomo II, Premier, 2008, p. 227)
Logo, a rejeição da pretensão é medida de rigor.
Demais motivações desta sentença
Não passa despercebido, ainda, que os representados tiveram expressiva votação nas eleições majoritárias, sagrando-se vencedores com 66,49% dos votos válidos dos cidadãos barravelhenses.
De acordo com a doutrina de Ruy Samuel Espíndola:
O Judiciário Eleitoral, manifestando a sua vontade judicial, deve, sobretudo, proteger a ultima vontade, a das urnas... Hoje com a protagonização do processo eleitoral não mais pelo eleitor popular, mas pelo juiz eleitoral, é necessário investir mais em advogados do que em marqueteiros, pois é muito provável que o resultado obtido nas urnas poderá ser subvertido ou golpeado na Justiça Eleitoral, em desfavor do eleito pela soberania popular... A vontade popular, nas urnas, não é pressuposto do Estado Democrático de Direito, é seu fim, sua base... é legitimação de todo o sistema republicano e democrático fulcrado na Constituição.
(Justiça Eleitoral Contramajoritária e Soberania Popular. A democrática vontade das urnas e a autocrática vontade judicial que a nulifica. Jus Navigandi - www.jus.com.br, texto 22745, publicado em 10/2012)
Devem de ser rejeitas, portanto, como no caso, alegações infundadas e sem justa causa ou mínimo de substrato probatório que, no dizer do autor acima citado, já contam, de certa forma, com a Justiça Eleitoral como sendo o ringue para o segundo round da luta política.
Outrossim, a prática de alguma conduta vedada do artigo 73 da Lei das Eleições não conduz, necessariamente, à cassação do registro ou do diploma, cabendo ao magistrado um juízo de proporcionalidade na fixação das reprimendas em atenção à gravidade do ilícito eleitoral (Tribunal Superior Eleitoral, Agravo Regimental em Recurso Especial 25.994, Relator Ministro José Gerardo Grossi).
Em decorrência das alterações havidas na Lei Complementar 64/90, ocasionadas pela Lei Complementar 135/2010, não se exige mais demonstração da potencialidade da conduta interferir no resultado do pleito, como sempre exigiram os tribunais eleitorais, sendo suficiente que se demonstre a gravidade das circunstâncias que caracterizam o ato abusivo, hábil a ferir a legitimidade e a normalidade do pleito, conforme dispõe expressamente o novo inciso XVI do artigo 22 da Lei das Inelegibilidades (Elmana Viana Lucena Esmeraldo, Processo Eleitoral, sistematização das ações, Mizuno, 2 edição, 2012, p. 208).
Logo, os fatos devem ter gravidade e potencial bastantes para violar o princípio da igualdade entre os candidatos e desequilibrar o pleito para que possam ser aplicadas penalidades, à luz da proporcionalidade. Ressalve-se, entretanto, que essa mudança de paradigma não pode importar em punições indevidas pela prática de pequenas irregularidades que não se revestem de força para macular o processo eleitoral. O termo "gravidade das circunstâncias" deve ensejar uma análise acurada dos elementos caracterizadores do fato, como suas causas, elementos e consequências. Ademais, é cediço que o órgão julgador deve se valer dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade na análise das condutas e julgamento da ação (Elmana Viana Lucena Esmeraldo, Processo Eleitoral, sistematização das ações, Mizuno, 2 edição, 2012, p. 321).
Também por esses fundamentos improcede a demanda.
DISPOSITIVO
ISSO POSTO, julgo IMPROCEDENTES os pedidos movidos nesta demanda por Coligação Todos por Barra Velha contra Claudemir Matias Francisco, Fábio Brugnago e Coligação Renova Barra Velha.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
O Estado Democrático de Direito não comporta o uso abusivo do direito, constituindo crime eleitoral a arguição de inelegibilidade deduzida de forma temerária ou de manifesta má-fé (artigo 25 da Lei Complementar 64/90). No caso, ao arguir situação preclusa como causa de inelegibilidade, tenho que os representantes podem ter deduzido pedido de forma temerária ou de manifesta má-fé, o que deverá ser melhor amadurecido. Assim, mantida esta decisão, certifique-se, extraia-se cópia integral dos autos e remeta-se ao Ministério Público Eleitoral para análise acerca da ocorrência do crime em tese referido.
Cumpra-se.
Oportunamente, arquivem-se, sem custas.
Barra Velha, 10 de dezembro de 2012.
IOLMAR ALVES BALTAZAR,
Juiz Eleitoral - 80ª ZE.